domingo, 6 de outubro de 2013

TRATAMENTO E CONTROLE DE CRISES ALÉRGICAS EM CÃES

Por Nívia Lo, atuante na proteção animal em Porto Alegre – RS.

O texto a seguir foi o resultado de muita peregrinação em veterinários e muito gasto com exames e medicações, totalmente desnecessários e sem eficácia, no tratamento de uma cadela da raça daschund ou tekel (linguiça) considerada, junto com as raças sharpey, buldogs e pugs, as mais alérgicas entre as raças caninas, por isso é sempre muito importante você pesquisar sobre a raça de um animal e a exigência de seus cuidados de pelagem, comportamento e alimentação, na internet, junto de federações de criadores e blogs de donos de animais destas raças, pois o vendedor é sua fonte menos confiável!!! Também somei muita experiência no tratamento dos animais que resgatei ao longo de anos, e que ainda resgato, frequentemente, com problemas de pele devido à falta de higiene, pela desnutrição e pela baixa imunidade causada pelo estresse da busca incessante por um pouco de comida ou água, ou um canto seguro para dormir.
Se o seu animal foi adotado e você descobrir alguns dos sintomas, não se preocupe, é só seguir as dicas abaixo que seu animalzinho terá uma vida completamente normal e saudável!!
Nunca abandone seu animal porque ele apresentou qualquer problema de saúde ou de pele. Além de ser um crime, passível de punição com multa e prisão, previsto na lei de defesa dos animais, você estará condenando o seu animal a um longo período de sofrimento nas ruas, sem assistência, e muitas vezes condenando-o à morte lenta e torturante por fome e sede, pois animais com problemas de pele são sempre rechaçados e mal-tratados pela ignorância do povo, assim como a sua, em acreditar que não há cura ou que possa ser contagioso.
Mesmo a sarna vermelha (sarna sarcóptica), que é contagiosa, já não o será, após as primeiras doses de medicação e o primeiro banho terapêutico!!!
Não desista do seu animal alérgico, não maltrate, não abandone....Cuide e trate bem do seu amigo de patas e ele será saudável como tantos outros, com muito pouco esforço!
Evitar o surgimento do problema sai muito mais barato e será menos trabalhoso do que recuperar um animal já em crise alérgica, mas nada é impossível se você for um dono consciente e responsável, e que realmente mereça se beneficiado por esta amizade inestimável.

Primeiro, é importante saber que a alergia em animais é o resultado de picada de pulgas (dermatite alérgica a picada de pulgas - DAPP), à picada de carrapatos, mesmo depois destes serem removidos do animal, alguns tem alergia a picada de mosquitos, moscas flebotomas (que sugam sangue), à ácaros, a perfumes, a sabonete, à ração, aos corantes dos alimentos...há aqueles que tem alergia à determinadas plantas do seu jardim, ou mesmo ao sol...Alguns se coçam mas não há nenhuma lesão aparente, nenhum parasita aparente, mas lembre que para um animal alérgico, basta que ele seja picado, mesmo que você nunca encontre parasitas na pele, o efeito de uma única picada pode ser o desencadeante de toda a crise. Em outros animais, a coceira se segue ao surgimento de pequenos caroços, esses caroços se transformam em pústulas, as pústulas rebentam e a pele descama produzindo muita caspa, numa lesão progressiva que faz também os pelos caírem.
Em cima disso, há o risco da contaminação bacteriana ou fúngica. Há o agravante da seborreia (também comum a certas raças e pelagens) e a contaminação pela própria saliva que o animal deposita na lesão ao coçar, mordiscar e lamber levando micróbios para a lesão. Tudo só contribui para um quadro progressivo e que vai se intensificar, fazendo com que seu animal fique irreconhecível, totalmente sem pelos, causando sangramentos da pele, otites graves, lesões de córnea e um mau-cheiro característico. Pode levar à inapetência, vômitos e perda de peso, pois o animal ingere o pus e restos de microorganismos da pele causando transtornos gástricos.
Mas, se o seu animal chegou a esse ponto, e você ainda não fez nada por ele, sinceramente, seria bom pensar em achar um novo dono para o seu animal...um que realmente se importe pelo seu bem estar e sua higiene. Seja atento aos primeiros sinais e evite chegar a todo esse sofrimento e a um gasto muito maior para recuperá-lo.

Então...
1. RAÇÃO OU COMIDA COZIDA - troque a ração, só use ração premium ou super premium, SEM corantes, e com baixo percentual de gordura. Se nada do que for indicado abaixo resolver, e isso seria muito raro, mesmo vc seguindo todas as recomendações, um último recurso a ser tentado é retirar toda a ração e passar a dar somente alimento cozido, pouco temperado, com pouco sal e pouca gordura (nada de aferventados dos sebos e graxas de restos de açougue).
Grande parte dos processos alérgicos é uma resposta aos componentes da ração, por isso mesmo há também no mercado rações HIPOALERGÊNICAS, que podem ajudar no tratamento da crise ou na manutenção do animal, se vc tiver como bancar o custo, pois são caríssimas.

2. BANHOS REGULARES - banhos 2X por semana, com shampoo de peróxido de benzoíla 2,5% mandado manipular em farmácia humana, sem perfume...esse shampoo é um adstringente forte para a pelagem do animal que tem seborreia, e tira bem o cheiro do pelo. Passa-se no pelo molhado, massageia bem, deixa agir por uns 5min e enxaguar. O peróxido também desinfeta a pele com feridas pq é antisséptico.
Se o animal não tiver seborreia, então procure usar o xampu com Clorexidine 2,5% + Babosa (Aloe vera) 3% + base qsp sem perfume, que vai agir como antisséptico e cicatrizante.
Esse 2 banhos semanais, são fundamentais, MAS QUANDO O ANIMAL TEM LESÕES, se as lesões sumiram, a pelagem está normal, o animal não tem seborreia, volta-se a fazer UM BANHO SEMANAL na manutenção e higiene da pele. Esses shampoos são de uso contínuo. Ou, se for na manutenção, podem ser usados na primeira lavagem do animal e finalizar com um shampoo neutro de sua preferência e hipoalergênico, como os shampoos indicados para nenês humanos.
Nos animais com seborreia intensa, pode-se usar um sabão grosso, ou detergente líquido e neutro de pia, com primeira lavagem e depois usar o shampoo com peróxido de benzoíla, como indicado. Pode fazer uso de uma escova macia para alcançar a raiz do pelo e higienizar eficientemente a pele, mas evite o uso da escova com o peróxido, que é forte e agressivo para a pele sensível.
Minha recomendação para donos de animais alérgicos é de que não devem banhar seus animais em petshops, faça isso em casa, vc mesmo. Por mais que se confie no local, eles raramente fazem o que se pede, as toalhas reutilizadas levam resíduos químicos de outras substâncias usadas em outros animais que podem desencadear alergias, o uso de secadores e de sopradores e estufas com altas temperaturas irritam muito a pele de um animal que já tem alta sensibilidade. É sempre importante secar bem a pele, além da pelagem, mas nunca com ar muito quente.

3. HIGIENE DA CAMA – você deve trocar as cobertas da cama ou casinha a cada banho para remover os pelos caídos, que levam junto restos de pele e são um prato cheio para a proliferação de ácaros, responsáveis por alergias em animais e pessoas. Evitar uso de roupinhas que abafam o pelo e propiciam o aumento da seborreia.

4. ASSADURAS - se o animal tiver assaduras no meio dos dedinhos e almofadas, e vc percebe  isso pq o animal lambe muito as patas entre os dedos, chega a ficar sem pele e sangrar se não tratar, as vezes fica mancando para caminhar e pode causar inchaço das patas, coloque na água do banho, numa bacia, tanque ou dentro de uma banheirinha de nenê, umas gotas de permanganato de potássio (farmácia humana) que é antisséptico e cicatrizante, e ponha as patinhas de molho nessa água do banho, enquanto banha o corpo do animal (podendo usar essa mesma água para molhar o pelo antes do uso do shampoo ou no primeiro enxágue, só cuidar para não colocar nos olhos). Banhe e higienize bem as patas e no meio dos dedinhos com uma esponja molhada nessa água.
O permanganato de potássio não é mágico, só mostra efeito a longo prazo...dá um desespero de ver o animal lambendo sempre as patas, e no pátio de terra é pior pq contamina, mas não deixe de USAR SEMPRE, mesmo depois da crise passar, que em cerca de 1-2 meses de uso as lesões vão diminuindo e desaparecem completamente. Se parar de usar, as lesões voltam. Nunca usar puro, direto na pele pq queima, é muito dessecante.

5. LESÕES PURULENTAS DA PELE - se acaso puder tratar as pústulas isoladamente, estoure, remova o pus com algodão, gase ou mesmo papel higiênico, e use uma pomada antibiótica para tratar localmente. Recomendo a pomada Nebacetin (uso humano) de venda livre, mas qualquer uma pode ser usada, só tem que cuidar para o animal não lamber e comer o antibiótico que vai fazer mal para o estômago.
Quando o animal está em um estado muito grave, com todo o corpo coberto de pústulas ou feridas, pode ser necessário ministrar a Cefalexina (comprimidos ou líquido) que é um antibiótico de venda com receita e teria que consultar o seu vet de confiança para obtê-la e é o antibiótico específico para tratar a pele, ou mesmo usar um antibiótico de longa duração que é o Convênia (injeção cujo efeito dura cerca de 1 a 1,5 mes, mas é beeeem cara) e de uso veterinário.

6. CONTROLE DE PARASITAS EXTERNOS - antipulgas e carrapaticidas para animais alérgicos, é fundamental manter um regime rigoroso da medicação contra esses parasitas da pele, pois o tempo recomendado pelas embalagens, de 3-3 meses, é muito pouco neste caso.
A indicação de reaplicação de remédio para animais alérgicos é a cada 15, 20 ou 30 dias!! Comprar a medicação para animais domésticos mensalmente é caro, por isso recomendo o uso do TopLine Red que é o Frontline para animais de grande porte (de campo) que é vendido em litro e é muiiito mais em conta, pode ser encontrado em Agrovets ou adquirido pela internet.
Aplicar 1ml para cada 10kg corporais (0,1ml por Kg) PARA CÃES. Gatos tem outra dosagem.
A Cipermetrina é só para o controle de carrapatos e não deve ser usada em gatos. Pode ser usada diluída como indicado na embalagem, para o controle do parasita no ambiente.
Há no comércio outros produtos, caros, mas que podem controlar somente pulgas e não os carrapatos junto (Advocate, coleira Preventic), etc, mais indicados para animais com sarna demodécica, que tem a vantagem de ajudarem a combater os parasitas no ambiente também, pois o veneno que fica no pelo que cai do corpo do animal continua fazendo efeito no ambiente, nas caminhas, etc. pelo tempo indicado.

É evidente que não basta controlar os parasitos no seu animal, e o animal do vizinho ou o ambiente estarem infestados. Todo o local e objetos onde o animal vive e tem contato (piso, paredes, casinhas, canis, cercas) também precisam ser higienizados e feito controle rigoroso dos parasitas. Se o ambiente é pavimentado, pode-se usar no chão a formalina 7% que no comércio é vendido como Lisoform, em garrafas vermelhas, diluída na água de lavagem, usar QBoa, para matar ovos de pulgas e ácaros, usar o Butox, que é muito tóxico e o animal deve ser removido do ambiente antes e após a aplicação até secar, ou ainda, passar a chamada “vassoura de fogo”, onde se usa passar um maçarico em todas as frestas do piso e paredes, pois carrapatos sobem até cerca de 1,5mts de altura e se alojam em qualquer irregularidade dos revestimentos das paredes também. Essa última opção só é aconselhada para quem tem experiência, ajuda (para evitar acidentes pessoais e risco de incêndio), e para quem tem pisos de terra, onde o controle com substâncias químicas é bem mais complicado ou impossível. Nestes casos é importante um ajudante que possa remexer com enxada a camada superficial do terreno e eliminar também os parasitos mais profundos no solo.

7. CONTROLE DA COCEIRA da pele, ouvidos e olhos - a maioria dos vets que não são dermatologistas recomendam uso de shampoos com Cetoconazol (só indicado em contaminação por fungo) ou a administração de corticoides (hidrocortisonas, cortisonas), sob a forma de cápsulas ou comprimidos, durante a crise alérgica intensa. Se você pegar um animal em início de processo alérgico, ou que não está com 90-100% do corpo recoberto de feridas e pústulas (o que significa que estará também sem pelos), NÃO USE CORTICÓIDES VIA ORAL. Eles são extremamente prejudiciais para os rins, fígado e se não forem usados de forma absolutamente controlada, bem dosados e retirados de forma muito progressiva, vão também comprometer, às vezes para o resto da vida, a supra-renal dos seu animal (um órgão que produz naturalmente corticoides e hormônios importantíssimos para a saúde de outros órgãos, para a imunidade natural, incluindo a da pele do animal), ou seja...vc faz uso de corticoide para ajudar na crise e pode criar um sério problema para o resto da vida do seu pet. Os corticoides administrados também baixam muito a imunidade do seu animal, e se for associado ao uso de um antibiótico para combater a contaminação das feridas por bactérias do ambiente, pior ainda, pois os efeitos se somam.
Vale lembrar que você jamais deve vacinar um animal após um procedimento cirúrgico, após um tratamento com antibióticos ou após o uso de corticoides, por esse motivo, correndo o risco do animal acabar desenvolvendo a doença para a qual se buscava imunizar.
Se a pele do seu animal estiver comprovadamente contaminada por fungos (exija o exame de raspado), e a lesão não estiver exsudando líquido, sangue e pus, não se preocupe em tratar. O fungo existe na pele de todos nós e no ambiente, é um organismo universal e oportunista, que só se torna prejudicial e se manifesta como patologia quando a imunidade do animal está baixa e a pele está lesada. Então, siga o tratamento indicado para a alergia, e quando a pele estiver recuperada, higienizada, a imunidade natural do animal se recupera com a boa alimentação e vitaminas, e o fungo simplesmente vai desaparecer com a continuidade e manutenção da higiene.
O uso de qualquer corticoide sob a forma de shampoo, ou mesmo pomadas diretamente sobre a lesão (desde que o animal não possa lamber e ingerir) não é desaconselhado, pode acelerar a cura, mas evite a medicação via oral.
O uso de pomadas com cortisona também pode ser interessante se o animal tiver lesões auriculares (dentro do pavilhão auditivo), que são muito comuns na crise alérgica. Higienize suavemente o local (o que pode ser muito doloroso) usando um cotonete umedecido em soro fisiológico, e aplique a pomada com corticoide usando um cotonete seco, por toda a área lesada, em uma fina camada, e espalhe melhor massageando externamente a orelha. Repita o processo 1-2X ao dia, conforme a gravidade do caso. Use o colar elisabetano se for necessário para impedir que o animal continue a coçar com as unhas dentro dos ouvidos e consiga ingerir a pomada.
É importante uma avaliação do seu veterinário para verificar se o animal não desenvolveu uma otite (resultante de uma contaminação bacteriana da pele que forra os condutos auditivos), o que vai necessitar o uso de antibióticos específicos para esse caso. Um dos melhores no mercado é o Otoguard (bactericida, antifúngico, anti-inflamatório e anestésico) com alta eficiência e alívio rápido para o desconforto e dor intensa que as otites causam ao animal. Como o uso de todo antibiótico, é fundamental a correta indicação de seu veterinário de confiança.

Se você quer ajudar seu animal em crise a diminuir a coceira, e assim se ferir menos, tente usar um anti-alergênico comum. Um anti-histamínico a base de clemastina que existe no comércio é o Alergovet C, procure informações na embalagem para a dosagem correta. Não são tão poderosos como um corticoide, alguns animais não respondem a essa medicação, outros respondem muito bem. Vale a pena tentar! Eu costumo usar por uns 3 dias seguidos, quando percebo algum sintoma de crise voltando, enquanto identifico a causa e retomo o tratamento intensivo. Costuma funcionar muito bem, mas não é para ser usado de forma contínua.

Durante a crise, a elevação da temperatura da pele causa a irritação das mucosas dos olhos pelo dessecamento e dificuldade em manter a lubrificação eficiente dos olhos, pode causar coceira e surgir pus nos cantos dos olhos, por vezes abundante. Higienize, apenas jateando com soro fisiológico, livremente, porque quanto mais hidratar os olhos, menos desconforto o animal terá e menos irritação com acúmulo de secreção. Há no mercado algumas soluções oftálmicas não medicamentosas e que são lubrificantes de longa duração, apenas observe se não contêm corticoides e podem ser usados como indicado. Apresentam glicerina ou óleos neutros naturais na composição, que ajudam a retardar o dessecamento da córnea causado pela elevação da temperatura da pele na crise alérgica.

8. FEBRE - raramente o uso de antitérmicos ou medicações para a dor possam ser indicados, eles tem efeito temporário, e se o animal estiver em tratamento adequado, a tendência é uma melhora rápida de seu quadro de saúde, sem necessidade do uso de mais medicação. Se achar necessário, busque aconselhamento do seu veterinário, pois nem toda medicação humana para a dor ou febre, pode ser usada com segurança em animais, algumas podem ser extremamente tóxicas.

Espero que as recomendações que fiz, como disse lá no início, fruto de muito sofrimento para dar conforto e solução aos problemas alérgicos que enfrentei com minha cadela de raça e com vários SRD (sem raça definida) resgatados da rua, possam ajudar a dar melhor qualidade de vida e conforto também para o seu cão. Esses problemas são mais raros em felinos, mas, eventualmente você pode tentar usar algumas das recomendações em gatos, embora, repito, minha experiência se restrinja ao tratamento em cães.
Boa sorte e se alguma dúvida persistir, me contate, quem sabe possa lhe esclarecer e melhorar esse texto com mais dicas importantes a partir de sua contribuição.